A maneira como as crianças pequenas lidam com a rotina, com a quebra dela e com os desafios de crescer em um mundo desconhecido merece atenção dos pais. Quando planejar a rotina ideal para seu filho, é muito importante cuidar para não introduzir, desde cedo, o costume de uma vida atribulada, com tempo escasso para as relações e para os momentos de interação e troca.
Muitas vezes, nós, adultos, sentimos necessidade de quebrar a rotina, variar o nosso dia a dia, fazer tudo diferente, pois nos entediamos com as repetições. Com as crianças pequenas, acontece justamente o contrário! As repetições são muito importantes para que elas consigam lidar com o desconhecido.
Da mesma forma, para os pais, quanto mais a vidinha do filho estiver organizada, melhor! Vera Tschiptschin Francisco - psicanalista, pedagoga e membro-fundadora da Gesto Psicanálise - explica que o “o bebê e a criança pequena vivem uma certa fragmentação interna. Cada sentimento é muito intenso, por exemplo, a sensação de fome é uma sensação avassaladora. Por isso, garantir um tanto de cadência, de ritmo, de previsibilidade e de continuidade àquilo que já sentiu antes, àquilo que se repete, frente a toda surpresa inerente ao desenvolvimento é fundamental”. Ressalta também a importância da rotina para a mãe: “a rotina acalma e diminui a angústia da mãe, que aperfeiçoa o contato e passa a se comunicar com bebê e com a criança pequena muito melhor”.
Por outro lado, Vera também aponta a necessidade de se manter uma flexibilidade nessa programação diária e não cometer exageros: “corre-se o risco de se apresentar um mundo para o bebê que é artificial, que é supercontrolado, onde não há variação. Consequentemente, lidar com as surpresas da vida se torna complicado, tanto para o bebê como para a mãe”. A rotina do dia deve ser tratada com uma importante referência e não como uma regra extremamente rígida. Cada família deve encontrar a medida que combina com seu perfil. “Para famílias extremamente organizadas o desafio é abrir o espaço para essa flexibilidade e para as famílias mais flexíveis em relação à rotina o desafio é se organizar!”.
A rotina mais estruturada é importante para o bebê nos primeiros meses de vida mas, gradualmente, ela vai sendo flexibilizada pelos pais para ajudar a criança a entender e aceitar as transformações decorrentes do seu crescimento.
Além disso, como lembra Sonia Madi - psicopedagoga e coordenadora das Olimpíadas de Língua Portuguesa do Cenpec - é importante deixar de lado o medo de colocar limites para seu filho: “Dizer não é muito importante! Muitas vezes, se pensa que se está protegendo seu filho evitando o ‘não’, mas isso é um engano! Assim se está impossibilitando um entendimento maior que ele possa fazer sobre o funcionamento do mundo!”. Por isso, não sinta pena de tirá-lo de uma situação em que está aparentemente aproveitando e seguir a rotina. Estender, por exemplo, a brincadeira e atrasar a hora de dormir pode desorganizar a vida de todos da casa.
Veja algumas dicas que podem ajudá-lo a organizar a vida de seu filho.
1. O espaço
Prepare um espaço em casa (qualquer cantinho serve!) com objetos, cores e sons adequados, propício para que seu filho vá descobrindo o mundo a sua volta. Ele deve perceber esse mundo, que não deve assustá-lo, e sim atraí-lo! Cuidado com a hiperestimulação. Certos momentos devem ser de contemplação e de relaxamento apenas. A psicanalista Vera Tschiptschin Francisco lembra que assim como os adultos, a criança pequena tem a necessidade de viver momentos de não fazer nada, sem nenhuma atividade, de estar sozinha, apenas "observando" o mundo a sua volta.
2. Os horários
Organize uma rotina que seja possível de seguir e mantenha os horários para as etapas do dia a dia acontecerem regularmente: hora de comer, brincar, tomar banho e dormir. A constância da programação traz segurança à criança, que passará lidar de maneira mais equilibrada ao movimento diário. Entretanto, Vera Tschiptschin Francisco ressalta novamente que cada família pode ajustar suas possibilidades internas e externas para organização dessa rotina. Dá o exemplo do sono da tarde: ele precisa acontecer, porém há pais que estabelecem esse horário e seguem um ritual de levar o bebê para o berço em determinada hora, independente da sua manifestação de cansaço. Outros pais aguardam até que surjam os sinais de sono, antes de colocá-lo para dormir. Não existe uma forma correta. Existe o que funciona para aquela família!
3. As refeições
A alimentação ganha na qualidade com a regularidade do horário e a forma que acontece. É importante com seu filho coma no mesmo lugar e no mesmo horário. Se um dia tem a opção de comer brincando ou sentado no sofá na frente da televisão, não entenderá porque não pode fazer isso todos os dias. Portanto, esse tipo de situação não é recomendável. Reserve essas variações para quando estiverem fora de casa, por exemplo. Caso a rotina seja alterada, é recomendável que se deixe bem claro para a criança o motivo dessa variação naquele dia e se preparar com uma dose extra de paciência para acompanhar os efeitos que essa variação pode causar em seu filho. Mesmo ele seja um bebê, deve-se conversar com ele: “estamos na casa da vovó de noite porque é o aniversário dela!”. Por outro lado, cuidado para não exigir da criança um comportamento à mesa que não tem estrutura para aguentar. Se precisar sair da mesa para dar uma voltinha na sala e retornar com mais paciência para o ritual da refeição, não há problema nenhum.
4. O sono
O horário de dormir, o ritual de como adormecer e a quantidade de horas dormidas são fundamentais para um dia seguinte tranquilo. O sono é reparador. O corpo da criança necessita dessas horas para se recuperar de tudo que aconteceu no dia anterior. O ritual de ir para cama deve ser claro para a criança. Deve ser precedido de brincadeiras tranquilas, de uma história contada e de uma música relaxadora. Assim, essa hora não será tão terrível. Mesmo porque, o ritual esclarece para a criança que irá se repetir no dia seguinte (brincadeira calma antes de dormir).
Por vários motivos inerentes a nossa vida atribulada, eventualmente, não será possível cumprir o ritual de dormir da criança. Faz parte! Nesses casos, porém, você precisa se munir de uma dose extra de paciência, pois, provavelmente, seu filho demonstrará seu desagrado. Estará no direito dele! Essas situações acabam surgindo como um treino para que seu filho experimente lidar com mudanças e que vá se abrindo para elas.
5. Os cuidados
Cuidar de si e do outro faz parte da rotina das pessoas da casa. Mostre isso a ele! Diga em voz alta: “Vou preparar um banho bem gostoso para você!” ou “Papai vai ler uma história para você dormir!”. Conforme seu filho vai crescendo, vá, gradualmente, transferindo para ele algumas responsabilidades. Peça, por exemplo, para que ele mesmo guarde brinquedos e arrume o quarto. Confie na capacidade dele de cuidar dos seus pertences e de si mesmo. Passe a auxiliá-lo no banho, ao invés de fazer tudo por ele. Sonia Madi, também lembra da importância de incentivar a criança a fazer conquistas. “É importante perceber que tipo de apoio ela precisa para ganhar confiança se arriscar a ir além, sem riscos”. Dê dicas, acompanhe de longe e faça apenas o que ele não conseguir. Com isso, você o estará preparando para assumir outro papel na sua própria rotina.
6. As escolhas
Aos poucos, vá dando a ele a oportunidade de fazer pequenas escolhas. Se até certo dia, você separava toda a roupa para ele vestir após o banho, chegará a hora de passar para ele a decisão de que camiseta vestir e qual sapato calçar. Esteja preparado porém, para aceitar as escolhas equivocadas. Ele pode escolher usar uma camiseta de manga comprida em pleno dia de verão. Mas, isso faz parte desse aprendizado. Isso dá mais trabalho, mas é fundamental para seu desenvolvimento e para a criança ir se percebendo com sujeito do mundo e consiga incorporar essa nova tarefa à sua rotina com mais naturalidade. Essas pequenas escolhas darão embasamento para que seu filho passe a fazer escolhas maiores na sua rotina: desenhar ou descer para brincar no parquinho.
Beijos
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Por Adriana Fonseca, para o portal Educar para Crescer
Foto: Aline Casassa